Emudecimento

E muda, me pergunto
Se devo falar.
E com dores, minhas idéias
Presas, ficam a pertubar
Minha alma, meu ser
Sobre a minha mudez.

E olho para letras.
Mudas são, e falam.
E as fotografias.
Tão mudas,
A eternidade encerram:
puramente caladas.

E volto a me calar.
Talvez encerre
O que nem consigo cogitar.

Sopro

Sopro, soprado.
Um leve sopro, com toda
Intensidade do mundo.

Choro, chorado.
Seguido de um sopro
O choro.
Da dor de ver o que seu
Sopro destrói.

Dor, dolorido.
Seguido do choro,
Resta a dor, lágrimas secam.
Dor fina, dolorida e risonha.
Que te pertuba os
Anseios.

Mas sopre.
Indefinidamente.
Que seu sopro vire tufão,
ou brisa.
Sopre e seja sopro.
Mas não faça sentido.

Malabarista

Caminhando sobre duas pernas de pau.
Oscilando sobre duas pernas de pau.
Equilibrando em duas pernas de pau.
'Malabarizando' em duas pernas de pau;

Cinco ou seis bolinhas de aço.
Quase caem.
Cinco ou seis bolinhas de aço.
Quase lhe fazem cair.

E olha do alto:
Uma criança lhe fita animada.
E olha do alto:
Seu chapéu, sem nenhuma moeda.

Com indiferença.

Como nós:
No nosso alto.
Com indiferença.
Sempre medo.
Sempre mudos.

Biografia

Eis que nasceu:
Era pequeno, feio
Era plebeu.

Eis que cresceu:
Era maior, magro
Era plebeu.

Eis que não evoluiu:
Morreu silenciosamente
Virou pó, sumiu
Não incomodou gente
Calado. Sem nenhum pio.

Eis que alma virou.
Ainda com toda a miséria,
Amava a desgraça humana:
Reencarnou.

Gente?

Gente
Gentilidade.
Gentescer.

Cansei.
Ser gente cansa.

Seja bicho.
Bicha, animal.
Animal que pensa.

E grite ui!
E ria.
E coloque os pés para cima...

Seja livre e faça o que quiser!
Não me leia, não me ouça.
Deixe de ser gente.

Ordens, papéis a fazer.
Posições a tomar.
Rumos a seguir.
Gente! Chega.
Gente - gentil.

( Ser gente cansa... )
Fim.

De Heráclito

E dentro de minhas veias dantes vazias-famintas, abundam agora rios de sangue.
Vermelho, roxo, preto... de tão vermelhos.
E não sei de onde eles vêm, nem o sentido que percorrem - mas existem e devoram com veracidade os finos capilares que entrecortam meus músculos.

São como o rio de Heráclito: suas águas mudam sempre.
Mudam não sei o quê, nem para onde.
Isso se esse sangue for meu.

Floreado

Flores campestres.

Floreando nascentes.
Florescendo em campos verdinhos.

Verdescências pintadas de vermelho.
Chamam sementes amigas.
Colorando,

Campesinas flores.
Se diferem das urbanas
( quiçá se existirem

Embelezar o colo daquela menina que desponta na colina
Sorridente, a espera
de algo ou alguma coisa
ou talvez de nada que tenha ciência
E talham, ralham as colhidas

Preferiam o papel de relvar.
E manterem-se remanescentes,

Remanascentes.

Fica pro porvir.

Avesso

E o avesso?
Deve ser o contrário.
E o avesso do avesso, seria o
descontrariado.

E o desavesso?
Talvez o avesso, o contrário,
o oposto,
sejam meras suposições
idéias e pontos de vistas
oriundos

do
nada.

E o nada, de onde vem?
Ausência do tudo.
Mas se há ausência, já houve algum dia.

E buscando o nada,
desvendamos que o nada espera que ninguém lhe desvende.
Lhe desnude, lhe tire as roupas escuras.

E que fique tudo branco no preto.
Preto no branco, cinza.

Vitrine

Veja lá, uma peça
de Porcelana.
Foi comprada.
Foi usada.
Foi quebrada.
E se pudesse

Seria porcelana de novo;
nem mais, nem menos
de novo.
Pela emoção?
Pelo simples fato
d'O ser o que se é,
continuar sendo.
Empenhar-se em pisar
os passos já pisados.

Pandora

Vielas escurimundas.
Foi nelas que eu adentrei.
E caminhei por elas.
Por longo tempo, depois cansei.

Encontrei uma caixa.
( empoeirada. Antiga? Não sei.
O que fazer? Pagar uma taxa.
Alta? Talvez. Eu a comprei.

Por qual motivo minha curiosidade se controlou?
Talvez medo do que pudesse ver? Indecisão...
Não sei quanto depois enfim, a coragem me tomou.

Só percebi que a caixa era minha, ó Pandora.
Bem feito, fiz como tu. Abri o que não devia
( sem saber que mo pertencia.

Por fim, constatei de que há coisas obscuras,
desconhecidas por nós, e que somos dados a donos.
Não só caixas ou pecados como o que cometestes, tola!
E mais do que não sabermos sobre as tais:

É melhor que não tenhamos conhecimento delas.
Ou, mais apuradamente
Melhor que não as procuremos.
Ou, ao fazer, não nos arrependamos.
- Como fizeste tu, ao deixar, a esperança, a nós o esperar.

Respiração

Suspiro.
Respiro.

Mais fundo.
Um ou mais um pouco.

Emergir à superfície.
Afundar em camadas de água cada vez mais profundas.
Independente do sentido, da direção.
Há de se encontrar uma luz.
... Da saída.
... Da morte.
Ambas, são o fim.
... De um caminho.
... De um tormento.

Independente da forma. Precisa-se.
Mais que vital é, respirar.
Sentir o alegrar, o jubilar de suas entranhas, de
Pulmões.

Com o entrar do ar,
poluído e impuro,
gripado, escuro.
Escuro é o barulho que fazem os pulmões.
Escuros e imersos em silêncio.
Bem como as luzes.
Silêncio.
Silenciada e gélida.

Concreto

C
Co
Col
Cola
Cola
Cola
COLADO!

S
Su
Sup
Supe
Super
Super Bo
Super Bon
Super Bond
Super Bonder
MERCHANDISING.

E uso colas.
E grudo.
Grudo as duas pontas do infinito.
E formo um envelope.

Papelaria

Em papéis velhos estão.
Documentos.
Importâncias.
Contos.
Partituras.
Velharias.
Borras de café.
Passado.
Comido. - Traças.

Nos papéis vermelhos e rosados.
Falar.
Ou escrever?
Amor. E frutas vermelhas.

Nos papéis amarelos e alaranjados.
Escrever.
Ou rabiscar?
Rascunhos e outras coisas amarelas.

Papéis verdes. Bem como os brancos, azuis.
Novos (re)começos.
Esperanças.
A escrever.
A não sair da mente.

Em papéis velhos ou novos.
Registros.
E o porvir. Mesmo que esse já tenha ido.

- ar

Acordar.
Levantar.
Espreguiçar.
Escovar.
Arrumar.
Arrumar.
Começar a estudar.
Estudar.
Estudar.
Organizar.
Arrumar.
Arrumar.
Organizar.
Organizar.
Recomeçar a estudar.
Pensar.
Pensar.
Criticar.
Voltar a pensar.
Pensar.
Pensar.
Lamentar.
Reclamar.
Reclamar.
Estudar.
Estudar.
Eu estudo, tu estudas, estudando, estudandos.
Estudar.
Estudar.
Almoçar?
Estudar.
Isso sim, estudar.
Estudar.
Estudar.
Estudar.
Irritar
Irritar.
Estudar.
Estudar.
Historicizar.
Estudar.
Estudar.
Virar (noite).
Virar.
Virar.
Desmaiar (de fome e sono).
Por fim, me matar.

Mas porquê não...
Dormir.
Sentir (uma brisa)
Dormir.
Dormir.
Assistir (um teatro)
Refletir.
Ouvir (palavras, músicas)
Rir.
Divertir.
Rir.
Rir.
Sorrir.
Comer e comer.
Viver?
Porque... Não há tempo.
E porquê não há tempo?

Porque o mundo é pequeno demais; No tempo de andar uma esquina você chega na Ásia.
Teletransporte?
Não, cansaço e delírios.

E você percebe que sua vida se resume à verbos de primeira conjugação.
E ainda assim, sentirá falta. Sentirá.