Corujas forçadas

meias.
à noite, umas meia noite
guardando pés que voltam do trabalho, do colégio
- ou podem também estar indo.
meias.
ao dia, uns meio dia
protegendo pés do calor matinal,
- ou simplesmente herança de pés cansados
que nem tiram sapatos.

subvertendo e ao contrário
estão tais corujas
corujas forçadas
corujas para não ser reservas
de banco, de exército, de mãos e pés
trabalhadores

corujas infelizes
corujas ainda competentes
corujas deformadas
corujas não naturais
(nada, nada)
corujas humanas
corujas alienadas.

Corujas, obrigada(s)
mesmo que não saibam (agradecer).

[ 21:30 às 21:37 ]

Dos meios

Em meio a tanto dinheiro,
Pobre é o rico, pobre é o pobre.
Pobrezas
diferentes, mas sem
riquezas.

Em meio a tanto desejo,
Busca-se o nada.
Sente-se tudo.
Inexiste o existente.

Em meio a tanto gás lacrimogênio,
Escasseou-se a chuva.

Em meio a tanta lascívia e roupa,
Me vi só e desnuda.

De tanto aço e silício,
Hoje eu me tornei automatizada.
Máquina humana, que precisa de combustível:
E este, mais essencial que o próprio

Funcionamento.

Porque?
Sem ele, não existe-se nada?

[ 21/04/10 - 24/04/10 ]

Esquinas

Andando até chegar à esquina.
O deparar com dois caminhos
E como se a vida tivesse sina
Obrigados fôssemos a suportar os espinhos

Esquinas
das decisões mais ávidas
dos caminhos mais decisivos
das profissões que caminharam
antigas, ao longo do tempo...

Esquinas, que ultrapassadas
Se configuram em início
E paralelamente em fim
Tem essa dubiedade como ossos
do seu estático ofício.
Das placas e informações
flageladas, largadas, nunca notadas.

(Ria-se)
Pois só desocupado
observa na esquina,
Desatinado e preocupado
pela falta de morfina.

Compra

Depois de muito
tempo guardado,
escondido, reservado.
Sai para a vida
Larga-se, desprevenida

Mas vem um, vem dois
vem três.
E um certo freguês a
Compra,
cheio de pompa,
cheiro leve de tulipa
Maçãs e linho.

Gelado, no frio.
Gelado no calor.
Impávido, todo brio,
derrama-se perante ti.
Numa vontade ordinária
Numa lascívia nada vulgar:
Vestida de um vermelho
Como o sangue de sua jugular.
E tinge de alto a baixo.
Branco, transparente,
Fique sangue.
De a vira o.

E toques:
as marcas do seus dedos
Febris, doentios
estarão, como num copo,
No corpo.
E com avidez segure:
não largue, ou se quebra
e deslizando, espatifa
Então, cuidado!

Como numa cerimônia
enlouquecedora
sedutor te apresentas
para aliviar tormentas
e inebriar os mais
vis e sóbrios
seguros loucos e todos
os outros.

Devore com os olhos
educadamente.
E fundo, engula.
E aproxime os lábios
Da superfície que
ao contato se torna
quente,
surpreendente,
vivaz.
A evaporação se fará
latente
E ousadamente,
as gotas restantes te escorrerão
Pelas mãos, gelando-a.
Não escaparás,
pobre incapaz.
E a unidade do frio quente
do quente frio,
que deita-se tranquilamente
E ao descer garganta abaixo
Causará arrepio.
Ai de ti!
Pobre mortal,
não saberás nunca saborear
Então,
enlouqueça
até que esqueça do que não deverias lembrar.
Envaideça
Até que se torne o que deverias virar.
Um bêbado sem causa,
Calmando por mais
daquele recipiente
que compraste tão barato
Mas que se tornou tão
intransigente.

Foi seu toque que tornou
Foi presente que proporcionou
Foi o vermelho que causou
Da boca
e do vinho, a relação não-amor.
Puro serviço,
não pago, não oferecido.
Acontecido, a cor:
foi o que te enfetiçou.

[Fica registrado que ainda farei melhor.]

Cortejo fleumático

E acompanho
ridente
um cortejo fúnebre.
Curiosa eu, vil
demente
quem morreu agora?

Um funeral fleumático
Onde não havia caixão.
As pessoas, carregavam
delicada e automático:
mas o faziam sem as mãos.

E num repente
Pude-me engolir
E num único mergulho
E me vi no esturo
Num ir e vir
entorpercente

Era oco, vazio-vácuo
E sem respirar, morri.
Daí voltei e me vi.
O cortejo era para mim.
Gritei, mas não era ouvida.
Pois na caverna oca
que estava,
o eco não existia.

Quedas piroclásticas
Fluxos piroclásticos
Me via inexistente
Existindo sem mente
No meu cortejo fleumático.